sábado, 23 de novembro de 2013

Nota de um pedido qualquer

O plano era simples. Após jantar em um dos melhores restaurantes da cidade, conversar sobre todos os assuntos que ela considerava importante e fazê-la rir; nós iríamos à praia. Ela tiraria aquele salto alto prateado, deixando pegadas na areia; soltaria os cabelos ao vento e sairia correndo na frente. Eu, sorrindo, tentaria alcançá-la para sentarmos num lugar estratégico onde as ondas alcancem nossos pés, com uma abrangente visão do céu. Depois de alguns segundos em silêncio, eu diria:

 “– Nós devíamos morar no mar. Deitar sobre as águas claras e observar as árvores de longe. Pegar carona com golfinhos para ir trabalhar e, à noite, observar juntos as estrelas sendo refletidas no chão. Os nossos beijos seriam os mais molhados. Nos faltariam ar, mas nos sobrariam o a(mar). A impressão de infinitude que os oceanos trazem combina com o que sentimos; e vê-los no azul dos seus olhos me faz ter vontade de nadar em direção ao interior da sua alma, ultrapassando os limites da profundidade para me esconder entre os seus segredos.” 

Assim, eu a beijaria e a pediria em casamento ali mesmo, apenas em companhia da água, dos astros e do vento. 

No dia seguinte, liguei para confirmar o encontro. Ela, com uma voz rouca e meio sonolenta, disse que sairia tarde do trabalho, mas que poderíamos jantar perto da empresa. Meu plano começava a ser levemente destruído, pois a empresa ficava a quilômetros da praia.  Contive minha insegurança e marquei às 20h. 

Nos encontramos em frente ao restaurante. Em vez do vestido Princesas Disney e o salto prateado que eu imaginei, ela vestia o uniforme do trabalho e um tênis Nike. Os cabelos, esses sim, estavam ao vento. Bem ao vento. Muito mais do que precisava. O jantar foi ótimo, pelo menos essa parte saiu como eu planejei. Preciso lembrar-me de não planejar tanto as coisas na próxima vez. 

Saímos de mãos dadas e caminhamos sobre a calçada de uma rua fria. Eu, ela e um silêncio além-segundos constrangedor.  Essa era parte que eu devia improvisar, por pior que fosse o resultado, devia fazer algo. Ela esperava isso de mim. E eu também. Chamei-a para sentar numa pracinha, foi o máximo que consegui pensar. No vão entre dois prédios que atrapalhavam nossa visão, era possível ver um pequeno conjunto de estrelas. E foi nesse momento que a beijei, como um pedido de desculpa, e logo iniciei: 
“– Nós devíamos morar no céu...”